Histórias em quadrinhos brasileiras têm conquistado o mercado internacional
Texto por André Di Bernardi

O universo das HQs no Brasil tem recebido boas notícias. Três acontecimentos recentes jogaram luz sobre a produção – e o sucesso – de quadrinistas brasileiros que conquistaram o mercado internacional: a estreia da série “The Umbrella Academy”, da Netflix, adaptada de HQ desenhada pelo paulista Gabriel Bá; a saída do paraibano Mike Deodato Jr. da Marvel Comics; e a transformação da revista desenhada por Leno Carvalho em série produzida por Steven Spielberg. “The Rift”, com ilustração de Carvalho – carioca radicado no Piauí – e texto de Dan Handfield e Richard Rayner, fará parte da série “Amazing Stories”. Ainda sem data de estreia, a produção vai chegar às telas do streaming pela Apple TV.
Já o desenhista e ilustrador paraibano Mike Deodato Jr. anunciou no seu perfil no Facebook que, após 20 anos trabalhando na Marvel Comics, vai deixar a empresa. Ele é o responsável pelos traços de ícones dos quadrinhos, como Hulk, Thor e Homem-Aranha. Deodato vai para um trabalho autoral na editora Dark Horse. A saída da Marvel vai ser efetivada em junho.
Para Gabriel Bá, a situação não é diferente. A Netflix estreou em fevereiro “The Umbrella Academy”, baseada nos quadrinhos escritos pelo músico americano Gerard Way e com ilustrações de Bá. Na história, uma família de irmãos com superpoderes se reúne após a morte do pai adotivo.
A lista de craques brasileiros não é pequena. João Pinheiro, Cirlene Barbosa, Marcelo Quintanilha, Greg Toquinho, Marcelo D’Salete, Robson Rocha, Eduardo Pancica, Gustavo Duarte, Wander Antunes, Orlandeli… e por aí vai. Para o quadrinista mineiro Marcelo Lelis, “todos esses nomes têm colaborado para que o Brasil seja visto lá fora como um país exportador de talentos. Claro, todos começaram publicando aqui. Lá fora, o mercado de quadrinhos é uma grande indústria”, explica. E a repercussão dos trabalhos desses autores demonstra o enorme talento que cada um deles carrega. “Dentre os nomes citados, cabe ainda ressaltar os trabalhos dos Marcelo Quintanilha e D’Salete, que têm desenvolvido narrativas muito próprias e que merecem igualmente destaque”, avalia.
Lelis aponta a competição como um dos principais desafios dos quadrinistas. “Um dos maiores obstáculos é a concorrência. Na França, nas décadas de 70 e 80, quando estavam em cena nomes como Moebius e Druillet, eram produzidos cerca de 500 títulos novos por ano naquele país. Ou seja, o álbum chegava na livraria e ficava ali duas, três semanas na prateleira, visível, sendo divulgado pelo livreiro. Hoje em dia, a indústria francesa produz cerca de 5.000 títulos novos a cada ano, entre inéditos e reimpressões. Aí o livro chega na livraria e em dois dias tem que dar lugar a outro, porque a rotatividade é grande”, diz.
<CW-48>Outro que enxerga com bons olhos o momento é o jornalista Henry Bernardo, um aficionado das HQs. “Costumo dizer que estamos vivendo o melhor momento na história das HQs no Brasil. A variedade de títulos à disposição, de editoras, é imensa. Além das HQs mainstream de super-heróis, que acredito serem ainda as mais populares entre os mais jovens, a oferta de quadrinhos mais voltados para o público adulto também é muito grande”, comemora.
Entrevista
Como você avalia o momento do mercado editorial das HQs no Brasil?
O momento das HQs, eu não posso dizer que é dos melhores, mas está longe de ser dos piores. Nós temos aí, de cara, mudanças no mercado, com a emergência de novos e bons nomes, que estão ganhando projeção nacional e até internacional. Estamos em tempo de mudanças, em tempo de boas oportunidades.
Que dicas você daria para aqueles quadrinistas que sonham em ter o trabalho reconhecido?
Eu diria o seguinte. Se você realmente acha que essa é a sua praia, você terá que entender que alguns sacrifícios terão que ser feitos. Isso no sentido de tempo, de paciência, porque o quadrinho exige prática. O quadrinho exige paciência.
A seu ver, é possível que uma pessoa, digamos, sem talento, consiga aprender a desenhar?
Acredito que sim. Uma pessoa que não tenha o tal do talento pode, sim, aprender a desenhar. Falo por mim. Muito do que aprendi, no começo de carreira, não foi com talento, foi com técnica, foi sentar e desenhar, sentar e fazer, fazer e refazer.
Quais as maiores dificuldades enfrentadas pelos artistas da área?
Atualmente, talvez o maior problema seja o excesso de informação, o que pode ser um contrassenso. Hoje em dia, todo mundo tem acesso a muita informação, num universo de infinitas possibilidades, e você acaba não sabendo para onde ir, você não sabe o que fazer com tudo isso.
Qual seria a saída para esse dilema?
Falta engajamento, principalmente das novas gerações. Uma geração que, a meu ver, é meio preguiçosa, uma geração que está com um ego muito inflado. Mas o que pode realmente atrapalhar, e muito, é a pessoa não entender, não interiorizar o seu aprendizado. Muita gente cai na bobagem de achar que sabe, sem saber. Por outro lado, tem a questão das oportunidades. Hoje em dia, está muito mais fácil do que na época que eu comecei.
Que nomes você citaria, que você indicaria neste novo cenário do universo das HQs?
O cenário é muito promissor, tem muita gente boa no Brasil fazendo quadrinhos. Mas eu citaria Greg Toquinho, Robson Rocha e Eduardo Pancica.
Fonte: O TEMPO