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Mercado de livros: Livrarias físicas enfrentam dificuldades para continuar em funcionamento

Sebos também procuram outros formatos para se tornar viáveis num mundo conectado

Wellington de Melo cita as “indie bookstores”, que operam de modo independente, fomentando clubes de leitura e outras iniciativas Foto: Gustavo Glória/Divulgação

As livrarias físicas vêm enfrentando dificuldades em todo o mundo, e a situação se intensifica no Brasil por conta da crise econômica. No Recife, recentemente, dois lugares emblemáticos para os amantes da literatura fecharam suas portas: a Livraria Cultura, no shopping Paço Alfândega, e o sebo Brandão, na Boa Vista.

Este último tinha quase 70 anos de existência e seu espaço foi melancolicamente ocupado por uma ótica, como uma espécie de recado final para os que não conseguem enxergar a importância do trabalho que era ali realizado.

Nesta última reportagem da série sobre o mercado de livros, falamos de passado e futuro e da esperança que pode existir para as livrarias físicas. Também trazemos a experiência das feiras literárias que ocorrem em diversos municípios pernambucanos e do sebo Casa Azul, em Olinda, que mobiliza dezenas de pessoas através das redes sociais e vem conseguindo trazer diversos eventos culturais para o espaço, localizado no sítio histórico de Olinda.

O jornalista e produtor cultural Samarone Lima era frequentador assíduo da Livro 7, espaço mítico que funcionou no centro do Recife entre 1970 e 1998. Hoje ele é proprietário do sebo Casa Azul, em Olinda, e se diverte colecionando os selos, carimbos e marca-livros que encontra dentro dos volumes que comercializa.

“Por eles, dá para descobrir um pouco da história das livrarias que havia no Recife e que já não existem mais. Dá para perceber que a cidade tinha toda uma gama de ofertas, uma vida literária muito mais intensa e cheia de opções”, aponta.

Saudosista, o antigo dono da Livro 7 (e hoje editor de livros), Tarcísio Pereira, chega a comparar o bairro da Boa Vista nos anos 1970 à argentina Buenos Aires, tida como a cidade que mais concentra livrarias por metro quadrado no mundo. Ele desfia nomes: Imperatriz, Nordeste, Síntese, Saraiva, Dom Quixote, Livro 7, Labor, Mozart, José Olympio, Artes Médicas… Várias empresas que funcionavam em paralelo, dentro de uma realidade em que a internet não existia e o centro da cidade vivia seu auge.

Hoje, a maioria das unidades faz parte de grandes redes e estão instaladas dentro de shoppings ou em bairros de classe média-alta. Uma das exceções é a Livraria Imperatriz, que do alto de seus 88 anos de existência insiste em manter lojas funcionando no centro.

“É muito difícil manter uma livraria de forma sustentável no Brasil. O modelo de livrarias físicas tende a desaparecer nos próximos 30 anos”, analisa o escritor Wellington de Melo, proprietário da editora Mariposa Cartonera e editor da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe).

“Fecharam muitas livrarias, e isso tem se intensificado nos últimos anos. A recessão que o Brasil enfrenta faz com que o consumo de livros caia e aumenta os custos operacionais a níveis muitas vezes insuportáveis. Paralelamente, o mercado passa por uma adaptação à chegada de novas tecnologias e às alterações nos hábitos de consumo. É uma situação de mudanças rápidas, que põe à prova a capacidade de adaptação dos empresários”, aponta por sua vez o presidente da Associação Nacional de Livrarias (ANL), Bernardo Gurbanov.

O último levantamento acerca do número de livrarias no Brasil, segundo o presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL), Luis Antonio Torelli, registra cerca de 1,4 mil empresas. Não há livrarias em 73% dos municípios brasileiros, e naqueles onde existem, a maioria está localizada no eixo Rio-São Paulo. 56% das livrarias brasileiras estão concentradas nas regiões Sul e Sudeste. O Nordeste fica com 15% do total, enquanto o Norte concentra apenas 3%.

“É uma hiperconcentração gigantesca e muito perigosa, e tão desigual quanto a distribuição de renda que existe no país e está interligada com o fato de menos de 20% da população brasileira é de fato leitora, com capacidade plena de ler, criticar e formular textos”, lamenta Gurbanov.

A CBL está tentando incentivar a abertura de novos pontos físicos de venda, com foco na especialização. “A gente criou um programa de formação para mostrar que é possível empreender e ganhar dinheiro abrindo uma livraria”, diz Torelli. A iniciativa não é fácil. “Livraria não é um negócio para abrir hoje e fechar amanhã. Sempre foi um empreendimento que precisa de tempo para se firmar. Um livreiro pode amar o que faz, mas não pode ser amador”, destaca Gurbanov.

Indo onde o leitor está

Entre as alternativas para fazer com que as obras alcancem os leitores “órfãos” de livrarias, estão as vendas online (embora prejudicadas pelo custo proibitivo do frete no Brasil) e as feiras de livros, que atualmente ocorrem em várias cidades do interior. Em Pernambuco, diversos eventos do gênero têm sido organizados na região metropolitana e em cidades como Caruaru, Petrolina, Pesqueira, Ipojuca, Garanhuns, Limoeiro e Salgueiro.

Segundo Alventino Lima (que já foi presidente e hoje é o diretor de feiras da Associação do Nordeste de Distribuidores e Editores de Livros – Andelivros), as feiras trazem oportunidades que vão além da venda de livros. “Há palestras, concursos literários, atrações que podem acrescentar à cultura local e regional”, enumera.

Experiência diferente

“As feiras proporcionam aos visitantes a chance de uma experiência diferente. Lá, podem conversar com autores e pegar seus autógrafos, ou encontrar uma oferta abundante de livros promocionais a um custo de R$ 1, R$ 2, R$ 5. A feira é emoção para a família, que tem acesso a um lazer diferente, e é comoção para a cidade e a região onde acontece, pois movimenta o comércio”, acrescenta por sua vez Bernardo Gurbanov, da ANL.

“As feiras são livrarias móveis, e de certa forma aprofundam a atuação do vendedor itinerante de livros, aquele herói que vai de porta em porta, de barco, moto, bicicleta ou a pé, levando o acesso à fantasia. Ajudam a criar o hábito da leitura, incentivam as crianças de cinco, seis anos a lerem. Em Garanhuns, há dois anos, uma professora de escola rural convenceu os alunos a economizar o dinheiro do lanche para comprar na Bienal. No dia em que a feira abriu, foi emocionante ver a alegria desses meninos com R$ 5, R$ 10 no bolso, falando com orgulho sobre a autonomia de poderem escolher e comprar seus próprios livros”, conta Alventino, emocionado.

Wellington de Melo cita as “indie bookstores”, que operam de modo independente, fomentando clubes de leitura e outras iniciativasFoto: Gustavo Glória/Divulgação
Samarone Lima confessa que precisou praticar o desapego para passar adiante livros de sua coleção particularFoto: Paullo Allmeida/Folha de Pernambuco
Hoje atuando no papel de editor, Tarcísio Pereira é saudosista em relação à sua Livro 7, que funcionou no centro do Recife até 1998Foto: Arthur de Souza/Folha de Pernambuco

Fonte: Folha de Pernambuco

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